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Escrever como ato coletivo, por Tainã Bispo

Arte com fundo rosa. Na lateral esquerda, o texto "Escrever como ato coletivo". Abaixo "por Tainã Bispo". No canto inferior direito, as logos da Editora Claraboia e Paraquedas.

Escrever causa uma agonia danada, né? Eu escuto isso todos os dias – de outras pessoas e de mim mesma. São tantas questões envolvidas no ato de escrever que a gente fica meio desnorteado. Porque escrever está longe de ser só um momento de sentar e olhar para uma tela em branco. Já seria desafiador o suficiente se fosse só isso. Mas não. A vida sempre exige mais – ela exige coragem para enfrentar a tela em branco e todas as questões materiais que estruturam a própria vida.

Quem pode escrever? Quem tem tempo para escrever? Já refletia Virginia Woolf sobre o tema em “Um teto todo seu”. E também @andreadelfuego, escritora-farol dos tempos atuais, em uma entrevista linda para o Claracast, podcast da @editoraclaraboia. Escrever presume escolhas absolutamente práticas do dia a dia: Quem vai cuidar da criança? Quem aguenta a ausência-silêncio do outro que está escrevendo? Pois é… as estruturas desiguais, machistas e racistas já respondem uma boa parte de todas essas questões.

Porém, ao mesmo tempo, as frestas existem – por mais que os tempos sejam sombrios, como efetivamente são (escrevo e repito essa frase-mantra num ritmo de autoconvencimento). Nos últimos anos, o mercado editorial brasileiro se movimentou bastante e temos tido muito mais mulheres e pessoas não brancas publicando seus livros (ainda falta muito, mas alguns passos importantes foram dados). Graças às deusas, arejar é urgente e é também resistência dentro dessa narrativa única na qual estamos nos afogando.

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Então, eu, como editora que vive o/no mercado editorial há 15 anos, comecei a perceber, também nos últimos anos, esse movimento de escrever no coletivo. Essa foi a pergunta que norteou as sete entrevistas que eu e minha amiga-irmã Ana fizemos na primeira temporada do Claracast ao percebermos a proliferação dos cursos de escrita criativa na pandemia. E essa ideia de escrever no coletivo tem me fascinado cada vez mais. Eu mesma participo do curso de escrita criativa da deusa-poeta e filósofa Geruza há quase dois anos, algo que mudou minha relação com a palavra: voltei a escrever (depois de um bloqueio de anos) e tenho encarado o risco de experimentar cada vez mais.

E, por ser aluna também, tenho pensado muito nesse dia a dia da escrita e de ser escritor. Será que precisamos enfrentar a tela em branco sozinhes (o tempo todo)? E, pensando em nós, mulheres, qual não é a importância de ter um compromisso para legitimar esse momento de se fechar no quarto para assistir a aula e fazer a “lição de casa”? Para além disso, são inúmeras as delicadezas de estar junto nessa aventura que é ser escritor. É uma delícia ler um texto escrito com dedicação para os colegas, ouvir elogios e críticas e, inclusive, sugestões que podem mudar completamente a configuração da narrativa.

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A experiência de ser provocado por exercícios, por textos novos, pela leitura dos outros, pela crítica da sua própria produção em um ambiente protegido e acolhedor é algo que amadurece o autor, tece alianças importantes para a vida literária, é experiência importante que ajuda a sustentar um corpo que terá vida própria – um corpo-livro fora de si. Qual autor não precisa disso? Todes precisam.

E é por conta desse bordado dos cursos e clubes de escrita que eu tenho escutado tantas histórias bonitas de pessoas que estão se descobrindo escritores, escrevendo seus primeiros textos e seus primeiros livros. Na editorapia, o divã para escritores que criei, ouço histórias lindas de descobertas definidoras de uma vida.

Curioso, também, que esse movimento se dá principalmente entre mulheres (pelo menos na minha amostra que, eu sei, é viciada). As mulheres criam clubes de leitura, clubes de escrita, são maioria nas oficinas, e são muitas das principais professoras de oficinas no Brasil.

Fico pensando se esse jeito de estar junto, de estar vulnerável para o olhar do outro, não seria um jeito diferente de fazer literatura. Um jeito menos hierarquizado e menos patriarcal. Será? É uma pergunta que me surge com frequência. Parece que as mulheres, ao poucos, vão encontrando frestas e mostrando um novo ritmo; novas formas de estar juntes, se apoiando e se fortalecendo, criando caminhos em espaços coletivos, criando novas narrativas e novas ficções que são, em essência, criação de futuro. E, por acaso, não é disso que estamos precisando?

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