É sempre bom ter conversas bonitas à tarde. Me parece que as tardes foram feitas para isso: conversas acompanhadas de café e bolinhos. Ela — que será uma Claraboier em breve — me contava que, após terminar o primeiro rascunho de seu novo romance, decidiu levá-lo para uma mentoria literária; e que, agora, está passando o texto por leitores-beta. Com um desses leitores, inclusive, ela se encontra toda semana para falar do livro, parágrafo por parágrafo. “Semana passada, ficamos duas horas em dez páginas”, me disse. Enquanto eu a escutava, percebi que ela me falava sobre algo que eu tenho pensado bastante: tecer um livro no coletivo.
Senti, também, que ela me contava de um respeito com o tempo daquele livro específico — o quarto de sua carreira literária, a obra que ela decidiu fazer com lentidão, o mais lento de todos. E essa palavra, lentidão, me fisgou. Cada livro tem o próprio tempo — o autor querendo ou não. E é nesse entrelaçamento de mãos e ritmos que um tecido de palavras amadurece. Mas fugir da lentidão não me parece uma opção. Pelo contrário. Me parece que, em algum momento, o escritor terá que encarar esse tempo arrastado das águas profundas. Como? Não sei ao certo, mas arrisco alguns palpites:
- Dedicar-se na reescrita. Como diria Marcelino Freire, em seu Ossos do ofídio, “Escrever todo dia não. Reescrever todo dia sim”.
- Acreditar nas parcerias. Mentoria literária, leitor-beta, oficinas de escrita criativa, leituras críticas… São inúmeros as mãos e os olhos que podem ajudar a amadurecer um texto.
- Apostar no amor. “Para poder escrever um romance, para suportar as tediosas e longas horas sentada que o trabalho implica, mês após mês, ano após ano, a história tem que manter borbulhas de luz na nossa cabeça. Cenas que são ilhas de emoção incandescente” — A ridícula ideia de nunca mais te ver, de Rosa Montero.
- Mergulhar nas profundezas. “Isso faz da escrita algo selvagem. Unimo-nos a uma selvageria anterior à vida. E a reconhecemos sempre, é a das florestas, antiga como o tempo. A do medo de tudo, distinto e inseparável da própria vida. Ficamos ferozes. Não podemos escrever sem a força do corpo” — Escrever, de Marguerite Duras.
- E escutar o corpo.
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Também quero acrescentar uma aposta importante da autora Tati Lazzarotto, que eu achei maravilhosa: ler em voz alta o próprio texto. Para si ou para um outro. Sentir o ritmo, a pulsação, as rimas impensadas, as cacofonias provocadas. Ler como quem conta uma história ao redor da fogueira. Como quem espera o texto lhe dizer se está pronto para ganhar o mundo.
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